Por Ana Vitória Castro, advogada no escritório Dosso Toledo Advogados
Após acumular um prejuízo superior a R$ 26 bilhões, a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (Correios) anunciou a elaboração de um plano robusto para cortar cerca de R$ 15 bilhões em despesas nos próximos anos. A iniciativa marca uma tentativa de reequilíbrio financeiro diante de uma das maiores crises já enfrentadas pela estatal, que há décadas desempenha papel importante na logística nacional.
O déficit contábil, revelado em recentes relatórios financeiros, acendeu um sinal de alerta para o governo federal e impulsionou a necessidade urgente de reestruturação da empresa. As causas do prejuízo acumulado são múltiplas: desde o crescimento da concorrência no setor logístico, passando por questões de ineficiência administrativa, até encargos trabalhistas históricos e passivos previdenciários elevados.
A proposta de corte de R$ 15 bilhões ainda está em fase de estudos internos e deverá contemplar diversas frentes, incluindo revisão de contratos, digitalização de serviços, enxugamento da estrutura administrativa e, possivelmente, programas de desligamento voluntário. No entanto, a medida também levanta preocupações sobre a manutenção da qualidade dos serviços prestados à população, especialmente em regiões remotas onde os Correios são, muitas vezes, a única presença logística disponível.
Do ponto de vista jurídico, a condução dessa reestruturação exigirá extrema cautela. Qualquer medida de redução de despesas — sobretudo aquelas que envolvam pessoal — deve observar princípios constitucionais como o da legalidade, moralidade e eficiência, além de respeitar os direitos adquiridos dos empregados e os parâmetros estabelecidos nas normas trabalhistas e administrativas.
Além disso, sendo os Correios uma empresa pública federal, eventual redimensionamento de sua atuação poderá exigir diálogo com o Congresso Nacional e envolvimento do Tribunal de Contas da União, dada a natureza estratégica da estatal e o impacto social de sua operação.
Este momento delicado também reacende o debate sobre a viabilidade de privatização da empresa. Embora o tema tenha perdido força após a mudança de governo, os recorrentes prejuízos e a dificuldade de modernização da estrutura podem recolocá-lo na pauta política nos próximos anos.
Independentemente do caminho adotado, é imprescindível que a reestruturação dos Correios seja feita com transparência, responsabilidade e comprometimento com o interesse público. A modernização da estatal não deve se dar à custa da exclusão de milhões de brasileiros do acesso a um serviço essencial. O desafio é grande, mas com planejamento jurídico e administrativo adequado, é possível encontrar uma saída que concilie sustentabilidade financeira e função social.