Por Murilo Aires – advogado
O incremento da complexidade das relações globais, sobretudo em termos político-econômicos, que envolvem tanto entes públicos como privados de diferentes Estados e regiões, dificulta cada vez mais a previsibilidade dos efeitos referentes a conflitos de uma determinada região em outra. A infinidade de cadeias que sustentam a globalização econômica ofusca a dependência recíproca entre os diversos agentes e fatores implicados, de modo que eventual efeito negativo é percebido, por vezes, do dia para a noite, surpreendendo até o mais cauteloso dos analistas.
Ao menos na mídia, não parece haver constatações ou previsões substanciais sobre os efeitos econômicos dos conflitos em Gaza em relação ao Brasil. A sensação, retirada do tom conservador de agentes econômicos revelado por determinados indicadores, é de que fatalmente haverá consequências, ainda que muito indiretas.
Quando da popularização dos conflitos na Ucrânia, a relação próxima entre Brasil e Rússia, bem como a dependência energética por parte dos países europeus escancarou de pronto os problemas que se apresentariam a partir dali.
Conflitos e crises, por óbvio, sempre existiram pelo mundo e permanecem se renovando, se reciclando ou se desenvolvendo. Ainda que sejam substancialmente resolvidos, darão espaço a outros problemas decorrentes da dinâmica global. Não se fala apenas de guerras. A crise climática aliada a outros efeitos naturais têm gerado ondas de calor extremo, em prejuízo da saúde das pessoas e dos recursos naturais.
Circunstâncias como as apontadas acabam por afetar a situação dos mais diversos contratos, desde os arranjos comerciais entre fornecedores, distribuidores, produtores; passando por investimentos realizados seja no mercado financeiro, em mercados de capitais ou financiamento direto; até a compra de passagens aéreas por consumidores.
Cabe destacar que, dos conflitos e crises destacados acima, nenhum surgiu de forma repentina, apesar do apelo midiático instantâneo. É importante que as partes envolvidas em uma negociação contratual que envolva de forma mais direta o ambiente internacional conheça os riscos envolvidos na transação, tendo ciência, na medida do possível, das condições jurídicas, econômicas, políticas, históricas e sociais atinentes às localidades implicadas. Para aqueles riscos de difícil, impossível ou inviável mensuração, que se tenha o devido resguardo.
Nesse sentido, além do conhecimento contextual dos ambientes em que se dá o arranjo, é preciso sempre estar atento às condições e consequências do encerramento do contrato por fatos imprevisíveis e incontroláveis, ou ainda pela inexequibilidade de seu objeto por questões supervenientes relativas à segurança. Concretamente, deve sempre se perguntar: qual é o risco e de quem é o risco? Tal questionamento não perpassa apenas por multas e garantias de reparação, mas também pelas instâncias a partir das quais se condiciona a realização dos direitos previstos em contrato.
A realidade não pode ser ignorada e não adianta nos abstermos em relação a ela.
*Murilo Aires é advogado do escritório Dosso Toledo Advogados, especialista na área de Direito Empresarial.