Por Cristiane Fais, CEO da Accrom Consultoria em Logística Internacional
Em recente declaração durante a Cúpula do Mercosul, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que o acordo entre Mercosul e União Europeia pode ser a resposta ao “unilateralismo de Trump” — em referência à crescente onda protecionista que marcou a política comercial dos Estados Unidos desde o governo do ex-presidente Donald Trump.
A declaração do Presidente da República, aponta uma visão estratégica de sua equipe econômica. Ela toca em um ponto central do debate sobre comércio internacional hoje: em um mundo cada vez mais fragmentado por disputas comerciais, acordos regionais e bilaterais ganham importância estratégica. E o Brasil não pode ficar de fora.
O termo “unilateralismo” diz respeito à adoção de medidas comerciais isoladas, sem diálogo multilateral, como barreiras tarifárias, sanções ou a saída de blocos e acordos internacionais. Foi essa a marca da política externa de Trump, que, por exemplo, retirou os EUA da Parceria Transpacífica (TPP) e iniciou guerras comerciais com países como China e México.
Para o Brasil, esse cenário trouxe desafios e oportunidades. Mas, acima de tudo, evidenciou a urgência de fortalecer alianças comerciais estáveis e baseadas em regras claras. É neste contexto que o acordo entre Mercosul e União Europeia, negociado por mais de duas décadas, volta ao centro da pauta.
Como especialista em logística internacional e comércio exterior, vejo com otimismo o potencial desse acordo. Caso seja ratificado, ele poderá trazer impactos significativos para diversos setores da economia brasileira:
1. Acesso privilegiado a um dos maiores mercados do mundo
A União Europeia é composta por 27 países, com um mercado de mais de 440 milhões de consumidores e alto poder aquisitivo. A eliminação ou redução de tarifas pode impulsionar as exportações brasileiras, especialmente de produtos agropecuários, alimentos processados, maquinário e manufaturados.
2. Ganho de competitividade logística
Com previsibilidade e redução de custos alfandegários, empresas brasileiras poderão planejar rotas, estoques e operações com mais eficiência, algo essencial para a competitividade logística. O comércio se torna mais ágil e previsível, reduzindo gargalos operacionais.
3. Padronização e integração regulatória
O acordo prevê avanços na harmonização de regras sanitárias, ambientais e técnicas, o que facilitará a entrada de produtos brasileiros na Europa. Isso exige uma adaptação por parte do setor produtivo, mas também cria novos patamares de qualidade e governança.
4. Atração de investimentos estrangeiros
Com um ambiente de maior estabilidade jurídica e comercial, o Brasil tende a se tornar mais atrativo para investimentos europeus em infraestrutura, tecnologia e logística, especialmente em portos, ferrovias e centros de distribuição.
É importante lembrar que o acordo também traz desafios, especialmente para pequenas e médias empresas brasileiras que podem enfrentar concorrência europeia mais intensa. Por isso, será essencial contar com políticas públicas de capacitação, financiamento e modernização da cadeia produtiva nacional.
Além disso, o setor logístico precisa estar preparado para novas exigências de rastreabilidade, sustentabilidade e digitalização, que são prioridades para o mercado europeu.
A declaração do Presidente da República, aponta uma visão estratégica de sua equipe econômica: O Brasil vem se consolidando cada vez mais – desde o início do embate de Trump com diversas economias como China, União Europeia, entre outros – como um ator global relevante, equilibrando relações com diferentes blocos econômicos, sem depender exclusivamente dos Estados Unidos, da China ou de acordos bilaterais isolados.
O acordo do Mercosul com a União Europeia já trazia até então bons presságios para o Brasil, e no atual cenário, representa mais passo em direção a um comércio mais aberto, moderno e baseado em confiança mútua — justamente o oposto do unilateralismo.
Se queremos um país mais competitivo, com empresas mais conectadas ao mundo e um comércio exterior eficiente, precisamos apoiar esse tipo de iniciativa e, principalmente, nos preparar para aproveitá-la com inteligência e planejamento.