O dia 27 de outubro de 2004 foi um dos mais chocantes e tristes para o futebol brasileiro.
Aos 14 minutos do segundo tempo da partida entre São Paulo e São Caetano, no Morumbi, válida pelo Campeonato Brasileiro, o zagueiro Serginho caiu próximo à pequena área de seu time, à frente do atacante Grafite e do goleiro Silvio Luiz.
“O Grafite (atacante do São Paulo) estava próximo a Serginho no momento em que ele caiu no chão. O Anderson (lateral do São Caetano) chegou a reclamar com o Grafite, pensando que ele havia derrubado seu companheiro de time”, lembra o jornalista e empresário Fábio Lucas Neves.
De imediato, todos perceberam a gravidade de seu estado, confirmada pelos médicos do São Caetano (Paulo Forte) e do São Paulo (José Sanchez), que constataram parada cardiorrespiratória e iniciaram os procedimentos para tentar reanimá-lo, com massagem cardíaca e respiração boca a boca.
A partida foi interrompida e concluída uma semana depois, no dia 3 de novembro. O São Paulo, que era dirigido por Emerson Leão, venceu o São Caetano (do técnico Péricles Chamusca) por 4 a 2.
Serginho foi declarado morto uma hora depois, já no hospital. Ele havia completado 30 anos oito dias antes, em 19 de outubro.
O REPÓRTER LÍVIO LAMARCA, ATRÁS DO GOL DO SÃO CAETANO
O repórter Livio Lamarca, que trabalhava na cobertura da partida, pela TV Record, falou com exlcusividade ao Portal Terceiro Tempo em 2016 sobre o episódio, relatando com riqueza de detalhes os momentos de tensão que envolveram a situação com Serginho, incluindo uma pergunta que fez a um médico, sobre a presença ou não de um desfibrilador, para tentar reanimar o jogador do São Caetano.
“Presenciar a morte de Serginho foi entrar em estado de choque de forma gradual. A situação inesperada se desenrolou em um suspense crescente. Derrubou o distanciamento profissional que tenho normalmente dos fatos. Em tudo, foi ruim. Estávamos eu e o cinegrafista Gringo atrás do gol do São Caetano, á direita do goleiro, acompanhando a corrida do árbitro em direção a Jean e Marcos Aurélio, caídos na disputa da bola. Vi de relance o Serginho cair à frente do Grafite, que tropeçou nele. Pareceu-me no momento encenação do zagueiro. Mantive a impressão até o goleiro Silvio Luiz levantar o braço agachado ao lado dele. Outros jogadores do São Caetano se agitaram em direção ao banco. Cãibra ou estiramento, pensei. Serginho chegou a mover as pernas. A roda no entorno encobriu minha visão de seu rosto. O semblante assustado dos outros foi o que me indicou ser coisa mais grave. Os cerca de vinte segundos até a chegada dos médicos foram angustiantes. Não havia ainda por que infringir a norma e atravessar a linha de fundo. Ainda hoje tenho a sensação de que não respirei enquanto faziam o boca a boca e a massagem cardíaca. O carrinho da assistência partiu com o jogador em direção ao lado oposto do campo e eu continuei parado. Chocado. Gringo foi quem me despertou, aos gritos de `vamos Lívio, atrás dele!´. Corri automaticamente em direção à ambulância, vazio. Entendendo lá os médicos batidos, perguntei, atônito, quase infantilmente sugerindo, se não havia um desfibrilador para tentar reanimá-lo. O médico respondeu que não”, relatou Lívio Lamarca, com exclusividade ao Portal Terceiro Tempo.
COMUNICADO OFICIAL DO HOSPITAL SÃO LUIZ
Serginho foi encaminhado ao Hospital São Luiz, próximo ao Estádio Cícero Pompeu de Toledo, no Morumbi, e de acordo com o comunicado oficial, ainda chegou com vida, às 22h05, mas não resistiu, mesmo com as chamadas “manobras de protocolo de ressuscitação cardiopulmonar”. Seu óbito foi declarado às 22h45. Natural de Vitória (ES) e criado em Coronel Fabriciano, em Minas Gerais, Serginho tinha 30 anos.
DIAGNÓSTICO DE DOENÇA CARDÍACA
No mesmo ano de sua morte, Serginho havia feito exames de praxe, acompanhado pelo médico do clube, Paulo Forte, que indicaram uma arritmia cardíaca.
O São Caetano foi alertado pelo Incor sobre o problema que o atleta sofria: miocardiopatia hipertrófica assimétrica. De acordo com a literatura médica é uma doença que provoca a dilatação do coração e é grave, podendo levar à morte súbita, exatamente o que aconteceu com o jogador.
O médico do Incor, que assinou o prontuário médico de Serginho, Edimar Alcides Bocchi, alertou para o risco de morte, mas o jogador, segundo relatos da época, dizia que não poderia parar de jogar futebol, pois tinha um filho para criar.
SEGURO DE VIDA E ACORDO DA VIÚVA COM O SÃO CAETANO
Serginho era casado com Helaine Cunha, com quem teve um filho, Paulo Sérgio, que na ocasião de seu óbito tinha 4 anos.
Helaine conseguiu receber valores referentes a dois seguros de vida e mais R$ 2 milhões por meio de um acordo com o São Caetano O clube sofreu um processo de homicídio doloso (com intenção de matar), que depois passou para culposo (sem intenção de matar). Em seguida o processo foi arquivado.
SITUAÇÃO DO SÃO CAETANO NO CAMPEONATO DE 2004
Além da perda humana para o clube e seus companheiros de time, a morte de Serginho trouxe um grande impacto para o São Caetano no âmbito esportivo.
O médico Paulo Forte foi suspenso pelo STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva), proibido de acompanhar a delegação do clube por dois anos, e a equipe perdeu 24 pontos no Campeonato Brasileiro de 2004, caindo de 77 para 53 pontos. Porém, conseguiu se livrar do rebaixamento para a Série B, ficando em 18º lugar entre os 24 que participaram do certame, vencido pelo Santos.
SINAL DE ALERTA PARA EVITAR CASOS SEMELHANTES
A morte de Serginho levantou a discussão acerca do aparato médico necessário em casos semelhantes àquele que vitimou o atleta de 30 anos, como a obrigatoriedade de ambulância próxima ao campo de jogo e presença de desfibrilador (aparelho elétrico para reanimação cardíaca), além dos exames de praxe que devem ser feitos na chamada pré-temporada.
Créditos: Terceiro Tempo Uol
Imagens: 7 Segundos / A Gazeta / Uol Esporte